Sou professor universitário e durante todos esses anos tive que lidar com classes heterogêneas em relação ao nível de conhecimento, formação cultural, origem socioeconômica, etc.
Minhas áreas de atuação sempre estiveram relacionadas a gestão empresarial, com destaque para recursos humanos e planejamento estratégico; matérias delicadas que estão ligadas ao propósito de maior retorno para os acionistas.
Pois bem, o maior retorno ao investidor é uma visão possível, mas também há teorias sobre a ação social da empresa e seu desdobramento na sociedade, pois falamos da dualidade força de trabalho e capital, assunto que não pode ser ignorado.
Ao longo dos anos, percebi que a visão da relação trabalho X capital está cada vez mais voltada para o capital, em detrimento da força de trabalho. Quanto mais vemos o fortalecimento do capital no dia a dia, mais vemos o capital mudar a nomenclatura do setor de recursos humanos, com denominações de colaboradores, talentos ou singelamente pessoas.
Educadores devem equilibrar suas aulas entre as teorias vigentes e alternativas, o educando deve ter liberdade para construir sua própria síntese sobre todos os assuntos.
Por mais que eu tenha uma visão mais social do que liberal, tenho que conhecer e dar conhecimentos sobre as correntes mais liberais aos alunos. E assim também um professor, que tenha uma orientação mais liberal, tem o dever de integridade intelectual de dar a conhecer aos alunos, as correntes mais voltadas para o social. Aliás, acho que os educadores devem ir além disso, promovendo discussões que possam libertar o pensamento dos alunos de anos e anos de treinamento dentro de uma linha de pensamento, seja qual for essa linha.
Voltando ao primeiro parágrafo, as classes são bem heterogêneas e para atingir o objetivo de abrir a mente dos alunos para a construção dessa síntese e tentar diminuir o máximo possível o viés de absorção ideológica passiva ou induzida, costumo lançar questões ligadas ao dia a dia para que possam servir de exemplo para o assunto da aula: pratico a tal transversalidade.
Lembro-me de uma aula de recursos humanos em que tratávamos de respeito às diferenças culturais por meio de um ambiente ascético, onde nenhum sinal ou símbolo religioso possa afetar a crença de um contra o outro. Um posicionamento simples poder-se-ia dizer, mas até que ponto a supressão de sinais e símbolos é sinal de respeito? Para ampliar o campo da discussão, coloquei na pauta a decisão francesa de proibir o véu das meninas nas escolas, um hábito importante da cultura islâmica.
As respostas foram diversas, mas se pôde discutir de forma aberta algo maior que a gestão de uma empresa. Cada um fez sua síntese e poderá no futuro encarar de forma mais elaborada a situação no campo de trabalho.
As discussões transversais devem ser direcionadas, utilizando-se temas mais abrangentes do que o assunto tratado, para melhorar a abstração e a capacidade de fazer convergir assuntos que aparentemente não são correlatos. No caso da aula de recursos humanos, o ambiente de trabalho foi ampliado para políticas educacionais e públicas da França, imigração, religião e direitos humanos.
Conforme a idade da classe, as abordagens transversais podem ser exploradas de diversas formas, quanto mais jovem, provavelmente, de forma mais lúdica e, com o exercício da técnica, evoluir para formas mais abstratas, o que formaria e combateria uma das deficiências notadas em alunos que ingressam no ensino superior, que é a baixa capacidade de interpretação e abstração de idéias a partir da leitura, embora muitos deles possam dissecar as frases do texto sintaticamente com perfeição.
Alexandre Mota