O curta metragem Dimensões do Diálogo (1982), dividido em três partes, do artista checo Jan Svankmajer, é considerado sua obra prima (vídeo abaixo). Nele acompanhamos 3 segmentos que nos mostram através de imagens grotescas e perturbadoras, a dinâmica das interações entre seres humanos. Em tempos de diálogos difíceis, de radicalismo e ruptura, o trabalho dele nos mostra através de metáforas as várias faces da relação Eu/Outro.
O primeiro segmento apresenta 3 cabeças humana que se consomem/destroem mutuamente. É possível observar diferenças entre elas, e interpretá-las como hierárquicas, étnicas, religiosas, etc. Com o tempo, as diferenças vão sumindo e todas vão ficando mais humanas. Serve tanto de crítica ao extermínio de culturas, quanto de exaltação da construção de uma identidade planetária. Ainda que violenta, é só na relação com o outro que eu afirmo a minha identidade.
A segunda parte mostra um casal que primeiro se ama e depois se odeia e se destrói, usando como disparador do conflito o produto de seu amor, quer seja um filho ou, numa leitura mais abstrata, a terceira pessoa que passa a existir quando um casal se forma – o NÓS.
Na última parte, duas cabeças travam um diálogo apresentando cada um seu argumento. Primeiro argumentos diferentes, mas que se completam. Depois argumentos diferentes que se estranham, e por último argumentos iguais que se destroem, destruindo inclusive as cabeças que dialogavam.
No vídeo acima, a ativista Elizabeth Lesser, que trabalha com saúde, criatividade, espiritualidade e transformação social, nos fala sobre os perigos da visão negativa sobre o Outro. A divisão e o ódio que ameaçam transformar a política moderna num jogo impossível encontram um terreno fértil nas redes sociais, onde a comunicação apenas parece próxima, mas que carece de contato humano, de olho no olho, de linguagem corporal, respiração e tom de voz.
Para avançar na construção de um diálogo, que nos aproxime uns dos outros, Elizabeth propõe que cada um de nós convide alguém que pensa de maneira oposta para um almoço, e que se estabeleça então um diálogo. Seguindo algumas diretrizes como não persuadir, defender ou interromper o outro, ser curioso e ouvir profundamente, os caminhos dessa conversa devem passear por algumas fases, como dividir experiências pessoais e expor as principais preocupações de cada um dos lados. O objetivo não é mudar os conceitos e as convicções do Outro, mas desconstruir os rótulos impostos pelo discurso polarizado.
Assim como no curta metragem de Jan Svankmajer, Elizabeth nos mostra que a relação entre Eu e o Outro é indispensável para a sobrevivência de ambos. Nos restringirmos a um círculo de pessoas que pensam exatamente como nós é destrutivo porque argumentos iguais anulam o Outro e não criam nada novo.
Elizabeth cita Martin Luther King – “Eu nunca poderei ser o que eu devo ser, a menos que você possa ser o que você deve ser”; Madre Teresa de Calcutá – “O problema do mundo é que nós desenhamos o círculo da nossa família muito pequeno”; e Nelson Mandela e o conceito UBUNTU – “Eu preciso de você para poder ser quem eu sou, e você precisa de mim para ser quem você é”; como exemplos de pessoas que buscaram ativamente esse diálogo de aproximação com o Outro.
E ela encerra o TED com o poeta sufi persa do século XIII, Rumi – “Para além das ideias certas e erradas existe um campo. Eu encontro você lá!”. Vamos almoçar?
Mauricio Zanolini