Duas entrevistas recentes chamaram a atenção por seus argumentos. Uma com o psicólogo e filósofo australiano Richard D. Roberts sobre educação socioemocional e outra com o professor de justiça criminal Adam Lankford sobre as causas dos tiroteios em massa que acontecem de forma recorrente em escolas nos Estados Unidos.
Richard D. Roberts fala sobre as vantagens práticas (leia-se econômicas) da educação emocional, como pesquisas que mostram o retorno de 7 dólares para cada dólar investido em programas com esse enfoque, a consequente queda nos gastos com criminalidade, saúde pública e serviço social, etc.
Adam Lankford aponta o acesso massivo da população civil a armamentos e a pressão que a sociedade americana exerce sobre seus cidadãos, ao estimular a busca pelo sucesso, fama e riqueza como forma de medir o valor do indivíduo, como causas desses massacres que acontecem principalmente no ambiente escolar universitário e no espaço de trabalho, onde o estímulo à competição impera.
No caso da educação emocional, fica claro que é preciso encontrar argumentos de eficiência econômica para convencer a sociedade competitiva das vantagens dessa abordagem. Infelizmente, isso transforma o conceito numa fórmula mecânica. Em um determinado momento da entrevista o psicólogo diz que os estudantes são treinados para aprender a pensar formas de resolver seus incômodos, ao invés de fugir ou se afogar nas próprias emoções. Parece interessante, mas se os resultados desse treinamento forem medidos e comparados com os de outros estudante e se o futuro do profissional depender desse resultado, a excelência em educação sociemocional passa a ser um objetivo competitivo, o que anula a essência da proposta.
O culto ao sucesso está diretamente relacionado ao grande número de casos de depressão, esquizofrenia, paranoia e narcisismo, que são características comuns dos atiradores que protagonizam esses massacres. A resistência do Congresso dos Estados Unidos a restringir o acesso da população civil a armamentos se justifica por essa mesma lógica que privilegia a defesa das liberdades individuais acima dos interesses coletivos, pensamento esse que é essencial para a sociedade norte americana, e por consequência, para o mundo globalizado, que é fortemente influenciado por essa cultura.
No filme de Roman Polanski de 2011, ” Deus da Carnificina”, baseado numa peça de teatro, dois casais se encontram para resolver um conflito entre seus filhos. O filho de um deles acertou a cabeça do filho do outro com um bastão, quebrando dentes e desfigurando temporariamente o adolescente. O que começa como uma tentativa de educar, civilizar e construir um senso de responsabilidade e comunidade nos filhos, rapidamente se transforma num desfile de egos, mesquinharias e frustrações, expondo a incoerência do discurso dos pais e de suas escolhas e convicções pessoais. Ainda assim no final os dois adolescentes conversam amigavelmente.
Nós somos os filhos de uma sociedade e de uma cultura que muitas vezes têm um discurso de valorização da convivência das diferenças, educação para a paz, busca de consenso, etc, mas que, na essência, se estrutura no estímulo à competição, na defesa cega das liberdades individuais, valorizando prioritariamente o sucesso financeiro. Existe uma incompatibilidade essencial entre essas duas posturas e cabe a nós abrir os olhos e compreender essa incoerência, se quisermos de fato mudar as coisas.
Mauricio Zanolini
A competição é a causa de muitos conflitos, precisamos educar para a cooperação e a convivência fraterna e pacífica. Só assim teremos um mundo mais humano e uma vida melhor.
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