Bryan Stevenson é um advogado norte americano que luta contra as injustiças do sistema judicial de seu país. Ele é diretor da Equal Justice Iniciativa, e provê assistência jurídica para crianças, pessoas com doenças mentais e condenados ao corredor da morte. No vídeo abaixo, um dos TEDs mais impactantes de todos os tempos, nos fala de sua visão de justiça, de qual será o legado que vamos deixar para o futuro e de como tudo isso diz respeito à nossa identidade como sociedade humana.
Um dos pontos da palestra é o comentário que ele faz sobre o sistema de justiça alemão onde não existe a pena de morte. Para nós que olhamos de fora, se a escolha alemã fosse diferente, seria ultrajante. No entanto, não conseguimos ver nossas próprias incoerências e distorções e justificamos nossas escolhas ultrajantes sem pestanejar. Digo nossas porque tanto nós brasileiros quanto os norte americanos temos uma dificuldade tremenda em nos reconciliarmos com a nossa própria história e fazermos uma autocrítica.
Para Bryan Stevenson, a pergunta que devemos nos fazer em relação à pena de morte não é se as pessoas merecem morrer pelos crimes que cometeram. Deveríamos nos perguntar se nós como sociedade temos o direito de matar. No Brasil não temos pena de morte, mas a lógica argumentativa ainda é a mesma – nós como sociedade temos o direito de encarcerar alguém em condições degradantes (pensando aqui no complexo carcerário brasileiro)?
E não se trata apenas de uma questão que só diz respeito ao contrato social, ao direito, à regulação das relações entre as pessoas. Tais escolhas refletem a essência de nossos valores e de nossa visão de quem queremos ser. Nas palavras de Bryan:
…nós afinal não seremos julgados por nossa tecnologia, não seremos julgados por nosso design, não seremos julgados por nosso intelecto e razão. Afinal, você julga o caráter de uma sociedade, não pelo modo como ela trata seus ricos, poderosos e privilegiados, mas como ela trata o pobre, o condenado, o encarcerado. Porque é nesse nexo que começamos a entender de verdade as coisas profundas sobre quem somos.
Com a educação é a mesma coisa. Nossa visão a respeito do ser humano vai determinar as escolhas que vamos fazer sobre como deve ser a escola, qual foco deve ter a educação, como será feita a avaliação, quem terá sucesso e quem fracassará. Assim como no caso da justiça, nós justificamos e encontramos explicações para todas as nossas escolhas, por mais absurdas que ele sejam. Qualquer proposta ou ação para mudar, ou ao menos questionar o sistema, é combatida com mais distorções e arbitrariedades (como a Escola sem Partido, por exemplo). Mas ninguém olha para o problema de forma ampla.
Em outro momento de sua fala, Bryan diz que se alguém mente, essa pessoa não é só um mentiroso, se rouba, não é só um ladrão, se mata não é só um assassino. Na escola o menor infrator, o “aluno problema”, o jovem com déficit de atenção e outros rótulos, são antes de tudo seres humanos em desenvolvimento. E é por isso que essa dignidade humana básica que é comum a todos nós, deveria ser a base para as escolhas que fazemos na justiça e na educação.
Mas talvez o comentário mais poderoso de Bryan Stevenson seja sobre a questão da desigualdade. Ele nos pergunta como seremos vistos pelos humanos do futuro que olharão para nossas escolhas nos livros de história. Como seremos julgados por eles? Qual a nossa identidade hoje como sociedade humana? Se não lutarmos para resolvermos os conflitos e as diferenças, se não lutarmos pela erradicação da pobreza, o que isso diz sobre quem somos? Para ele o oposto de pobreza não é riqueza. O oposto de pobreza é justiça. E eu acrescento que também é educação.
Mauricio Zanolini