Recentemente um país como Singapura, que há décadas figura nos primeiros lugares dos rankings internacionais que medem a qualidade da educação, começou a mudar o caminho rígido da meritocracia, estimulada pela competição como base do sistema de ensino. E o que vem provocando essa mudança é a falta de coesão social e a nova economia.
Foi com uma educação de acesso universal, com ações sincronizadas entre as demandas do mercado de trabalho e o ensino técnico profissionalizante, com foco em credenciais acadêmicas e no mérito, que Singapura construiu um sistema de ensino “vencedor”. Os efeitos colaterais dessa fórmula são pais e alunos obcecados por notas e testes, que confundem virtude com conseguir uma vaga nas melhores escolas. A renda das famílias que podem sustentar atividades extras e aulas de reforço criam a falsa impressão que a condição econômica determina quem tem valor e quem não tem.
Essa distorção de valores levou o governo de Singapura a buscar um modelo de sociedade mais justa, onde as relações sociais fossem construtivas e solidárias. Para isso é preciso desenvolver as habilidade emocionais, o senso de responsabilidade coletiva, construindo uma cultura escolar baseada em relações de atenção e confiança. Com esse novo objetivo, passou-se a desencorajar as instituições de ensino a venderem sua excelência acadêmica fazendo propaganda de seus melhores alunos. Além disso, os diretores mais experientes foram para as escolas que precisam de mais ajuda, e os alunos com dificuldades começaram a receber mais atenção.
Esse programa de cidadania educacional tem como foco o desenvolvimento integral da criança, e por isso o processo de admissão é mais flexível e os alunos contam com o apoio de conselheiros que os ajudam com decisões sobre vocações e escolhas profissionais. Mas todas essas mudanças não são fruto de uma visão idílica de um futuro de liberdade e autonomia para todos os indivíduos. Singapura é uma republica parlamentarista que tem um Estado centralizador e um sistema judicial rígido. A busca por um novo modelo educacional é principalmente uma resposta à dependência do país em relação a uma economia globalizada. Para se manter no “topo”, é preciso desenvolver as habilidades necessárias para enfrentar um mercado de trabalho global e digital.
A adoção de hábitos saudáveis, a percepção do impacto negativo da atividade humana no meio ambiente, a capacidade de resiliência, etc, são consequências da autoconsciência e da autodireção. A nova economia precisa de pessoas que empreendam, que sejam criativas e que busquem ter impacto em escala global. Ao corrigir a fragmentação social deixada pela competição excessiva, Singapura pretende oferecer um ambiente mais propenso a tudo isso.
Enquanto isso no Brasil temos um longo caminho pela frente em relação ao que fazer com a educação das futuras gerações. Todos os remendos e as maquiagens implementadas nos últimos anos não foram capazes de alterar o cenário desolador da nossa educação pública.
Algumas das iniciativas particulares de maior visibilidade, como o Movimento Todos pela Educação, são estruturadas em medições e avaliações recorrentes, usando como base testes padronizados e modelos “vencedores” como os dos países asiáticos. Outras ações governamentais como a reforma do ensino médio são apenas respostas rápidas para melhorar os altos índices de evasão, com pouca ou nenhuma efetividade em relação à formação do indivíduo e seu papel futuro na construção do país.
Talvez o nosso maior problema seja o isolamento. A dimensão continental do nosso país faz com que sejamos independentes na produção e no consumo, garantindo nossa autonomia enquanto viramos as costas para nossos vizinhos e para os novos contextos econômicos do século XXI. O modelo de Singapura, o antigo e o novo, não servem para a nossa realidade, mas as razões e as escolhas deles podem nos ajudar a sairmos desse casulo.
Mauricio Zanolini
Parabens, Mauricio!
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Excelente texto . uma forna de repensar o ensino brasileiro q. hoje não atende as necessidades dos alunos , fazendo com q. os façam desistir da escola por total desestímulo de uma política q. não prioriza as pessoas.
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Excelente artigo! Tenho vivido uma realidade que exalta unicamente o aspecto cognitivo, provas e simulados entorno de notas, estatísticas com o desempenho das crianças. Percebo angústias e sofrimentos quando não se atinge essas tão esperadas metas. Simplesmente preocupante.
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gostaria de seu comentário relacionando a escola pública e o menor infrator
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Boa pauta Marisa. Vou fazer! Abs!
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