O acesso ilimitado à informação está o serviço da desinformação, um processo que já percebemos, mas não combatemos.
Se colocarmos na pesquisa do Google “o processo de desinformação” encontraremos dezenas de artigos sobre o assunto, principalmente ligados aos meios de comunicação. Para esse texto me apoiei em dois desses artigos; um de Diego Augusto Bayer, publicado no canal Jusbrasil, e o outro de Luciano Martins Costa, publicado no canal Observatório da Imprensa.
Duas citações colhidas por Bayer em seu texto são interessantes, a primeira de Dario Melossi (1992):
um discurso nunca é simplesmente a expressão de uma opinião, mas uma proposta de organizar o mundo de determinada maneira;
o segundo de MunizSodré (1999):
os meios de comunicação (…) constituem o lugar primordial de construção da realidade ou de moldagem ideológica do mundo a partir da retórica tecnoburocrática de inspiração gerencial.
Melossi coloca a INTENÇÃO como um componente do discurso; se alguém quer se fazer entender, esse alguém inevitavelmente vai impor sua visão de mundo. A INTENÇÃO aparece tanto quando aquele que comunica tenta propositalmente ser isento ou quando tenta dar sua opinião, portanto a forma como o discurso é organizado é sempre ideológica.
Sodré cita os meios de comunicação como os grandes indutores desse processo de desinformação a partir do poder de construir uma visão de mundo palatável e sem profundidade. Quando cita a retórica tecnoburocrática, ele está alertando para o discurso simples que busca o respaldo, mesmo de leve, de uma visão prática e lógica para sua validação, geralmente ligada a alguma corrente de pensamento que esteja sendo discutida de forma rasa pelos jornais e programas de televisão.
Luciano Costa em seu texto explica as técnicas da desconstrução da informação:
A técnica é até simples: manipulam-se os significados possíveis de uma informação e entulha-se o contexto com redundâncias, que irão ecoar continuamente a mesma base de significados, até exaurir o receptor do processo de comunicação. As manchetes, artigos e editoriais condicionam o significado; o noticiário produz a redundância desinformativa.
A técnica não é tão simples assim para nós leigos. Entende-se que um fato tem determinado significado, porém mesmo falando do fato em si é possível dar-lhe novos significados ao buscar mais informações que diluam seu impacto e, após inúmeras repetições, é possível criar um discurso que aumente ou diminua a importância do fato, ou, mesmo, que crie confusão sobre o mesmo. Assim se dá em assuntos econômicos, políticos, e que versam sobre ética e valores.
Não por acaso, o indivíduo na época pós-moderna tem como uma de suas características básicas a insegurança, fruto de um desconstruir de significados, que o coloca à mercê das possíveis interpretações; que não são mais coletivas, como eram, quando grandes movimentos publicavam seus manifestos. Agora se presume uma atitude individual, o que nos leva a um processo em escala aritmética de interpretações de um mesmo fato, o que sem sombra de dúvida, esvazia-o de qualquer significado ou valor.
O processo de desinformação está avançado, com meios de comunicação que invadem nosso dia a dia a partir dos aplicativos de troca de mensagens, redes sociais e de compartilhamento de imagem e som. Osvaldo Vivian Jr., repórter e escritor, foi feliz em um micro conto Mesa de Babel, no qual pessoas são convidadas para um jantar especial, reúnem-se em um restaurante, mas agem desconectadas entre si e mesmo em relação ao seu anfitrião, que inicia o jantar dando a conhecer o motivo do convite. O resultado é um claro sinal da opção que muitos estão escolhendo viver dentro de suas bolhas algorítmicas, o que acelera a desconstrução dos significados, já que aquilo que não me agrada eu recuso, assim não conheço o novo e perco aos poucos a significância daquilo que me era caro; resta-nos o mal estar típico de nossos tempos.
Ou seja, a luta contra o processo de desinformação é uma luta que convida a pessoa a permanecer alerta ao seu entorno e não perder a capacidade de mudar a si e influenciar o seu redor por meio de uma linguagem que tenha um discurso (sim, mas com uma visão de mundo) que queira entender o mundo de fato e não assumir que o mundo seja inexplicável e, no fim das contas, sem sentido.
Alexandre Mota