Utopias – combatendo o extremismo com verdade, diversidade e esperança

A ativista e documentarista muçulmana Deeyah Khan também escreveu para a coluna do jornal inglês The Guardian sobre ideias utópicas (que estamos comentando aqui no blog da Universidade Livre Pampédia). Ela nos fala sobre a necessidade de rejeitarmos as ideias extremistas que leem o mundo de formam maniqueísta e estimulam o conflito.

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Ela começa perguntando o que leva alguns homens muçulmanos à radicalização. Em seu documentário (Jihad, de 2015) ela entrevistou muitos ex-extremistas islâmicos. Nessas conversas Deeyah Khan percebeu que os jovens, homens e mulheres recrutados, tinham uma história de trauma, carregavam sentimentos de impotência e vulnerabilidade, dores que os conectavam ao sofrimento dos muçulmanos em todo o mundo.

Essas emoções negativas eram substituídas por um senso de propósito, pertencimento e camaradagem quando eles se juntavam ao movimento. A segurança que esses laços ofereciam era acompanhada de uma visão de mundo bem específica, de que só a guerra santa (o jihad) pode purificar com fogo este mundo dividido entre pessoas boas (eles) e más (os outros). Mas para Khan, é um erro concluirmos que existe algo especialmente tóxico dentro da fé islâmica (ou de qualquer outro tipo de fé). O extremismo não é um fenômeno isolado ou exclusivo da religião. Qualquer sistema de identidade que diminui a importância do outro, leva para o mesmo caminho, mas nossa própria associação a um tipo específico de identidade nos dá uma leitura diferente do extremismo que, no fundo, é o mesmo.

Para ilustrar isso, Khan compara dois casos que recentemente voltaram à mídia nos Estados Unidos. Em um deles (2011) o FBI prendeu dois cidadãos iraquianos (Waad Ramadan Alwan e Mohanad Shareef Hammadi) que tentavam enviar armas para a Al Qaeda. No outro (2012) a polícia prendeu Richard Schmidt, o líder de uma organização defensora da supremacia branca, que tinha um arsenal estocado para colocar em ação seu plano para assassinar cidadãos negros e judeus. Hammadi pegou a pena de prisão perpétua e Alwan a pena de 40 anos de prisão (além do governo federal ter restringido a imigração por conta desse caso). Richard Schmidt foi condenado a 6 anos de prisão.

Nos dois casos o sistema de identidade, sejam eles étnicos ou religiosos, se baseiam no senso de vitimização e de superioridade diante do outro, de lealdade ao grupo e de ódio àqueles que estão fora do tal sistema.

Nas palavras de Khan, o jihadismo e o etnacionalismo são expressões de crise em escala global, numa época em que a vida dos jovens está marcada pela incerteza. A insegurança política e econômica (e eu incluo aqui a incerteza em relação à sustentabilidade do planeta), se traduz em insegurança na vida cotidiana das pessoas. A tendência de criar grupos identitários voltados para dentro, exclusivos e agressivos, que impõem sua própria justiça, é também causa e efeito de expressões políticas populistas que hoje são um fenômeno global (Putin, Erdoğan, Modi e Trump, entre muitos outros).

Por fim, Kahn nos diz que ao invés de olharmos para trás para restaurarmos um tempo mais simples (mais maniqueísta e nada realista), nossa única saída é abraçar aquilo que é mais intrínseco à vida humana – a diversidade. A utopia dela são políticas que trabalhem para uma distribuição equitativa dos recursos mundiais e que resistam à concentração de riqueza e poder nas mãos de poucos. O promessa não cumprida da igualdade deve ser buscada através de políticas de educação, status e oportunidades entre indivíduos, independentemente da cor, sexo ou fé.

E isso inclui termos conversas desconfortáveis, mas necessárias, com aqueles que, na superfície, parecem completamente diferentes de nós. Inclui também não contarmos mentiras, mesmo que bem intencionadas, mesmo que nosso impulso seja o de evitar a dor que a verdade pode trazer. Precisamos de uma política de esperança e de unidade contra uma política de desespero e ressentimento. Se existe uma utopia, devemos construí-la no encontro, longe do maniqueísmo, para depois pintá-la com todas as cores gloriosas da experiência humana.

 

 

 

 

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