Educar para a paz e mediar conflitos: quais os caminhos? Esse é o título do Encontro online que está sendo realizado em parceria com a Universidade Livre Pampédia e que teve início na última semana.
A proposta é debatermos sobre o tema da não-violência, amparados por um material teórico que inclui autores como Jean-Marie Muler, Marshal Rosemberg, Regis de Morais, Edward Braintmeier e Dora Incontri e pela mediação das curadoras do conteúdo que aqui escrevem: Luísa Módena e Kátia Del Giorno, apoiadas por dois tutores: Viviane Ribeiro – que também assina esse artigo – e Maurício Zanolini, bem como pela experiência de um valioso grupo que tem se mostrado muito diversificado e participativo.
Dentre os muitos debates já iniciados, resolvemos trazer para esse espaço algumas reflexões iniciadas pelo grupo e que nos fazem pensar sobre o papel da esperança e da nossa ação individual para a construção de um mundo no qual os relacionamentos sejam pautados pela escolha da não-violência.
Falaremos aqui não daquela esperança da inação, que apenas espera, mas daquela que tem como base uma paciência histórica, que reconhece as limitações e possibilidades do momento, mas que nunca desiste, pelo contrário persiste e entende que mudanças não são mágicas, são processos.
Comecemos por lembrar de Paulo Freire que, com a sua Pedagogia da Esperança, nos alertou para ficarmos atentos e não perdermos a capacidade de nos indignar e, com isso, seguirmos em frente lutando pelo mundo em que acreditamos.
Não há como abrirmos os jornais, sairmos às ruas ou presenciarmos cenas cotidianas tão absurdas e tão distantes da paz que desejamos e não sermos tomados por um sentimento de impotência diante dos fatos estarrecedores que vivemos, seja na esfera íntima ou social. E isso, muitas vezes, nos causa um sentimento de impotência.
No entanto, acreditamos que se aliarmos esperança ao engajamento em fazer acontecer o mundo com que sonhamos, isso nos fortalecerá para o enfrentamento dessas realidades, uma vez que se por um lado ainda há muitas perplexidades e atrocidades, por outro vemos também várias microrrevoluções se darem, motivadas por essa esperança que é toda movimento, engajamento, persistência, criticidade, busca constante.
Trata-se de uma esperança que procura e abre caminhos para a prática. Sobre isso, destacamos aqui a experiência que Luísa Módena relatou no curso, ao debater sobre como alcançar essa prática num mundo que parece não abrir espaço para uma cultura de paz.
“Eu lia sobre a não-violência e entendia que aquilo era algo que eu buscava. Mas achava o conceito ainda muito etéreo e sem base objetiva. Até que encontrei um primeiro passo para o exercício prático quando passei a entender que a ideia de não-violência passa a ser muito mais concreta quando partimos do pressuposto de que a violência está ali, ela é fato, ela ainda faz parte das nossas relações e da cultura. Mas a diferença está na postura não-violenta adotada: apesar de identificar a violência, existe a RECUSA em legitimá-la qualquer que seja a situação; ou seja, existe a RECUSA em tratar a violência como um mal necessário. Por isso, entendo que ao me recusar a legitimar a violência (no sentido de encontrar “razões” para justificá-la), posso dar um passo neste processo de transformá-la. Ao me posicionar frente a uma violência, eu tenho uma condição de ESCOLHA do passo seguinte, mesmo que eu ainda não consiga dá-lo. Entendi, então, que isso pode ir nos aproximando, pouco a pouco, do ideal da paz. Mas que para atingir a paz eu preciso antes passar pela não-violência (reconheço que a violência existe, mas não a legitimo)”.
É essa esperança cheia de ação – e que busca caminhos mesmo dentro de um sistema que parece nos engolir – que queremos inspirar. Não aquela de quem afirma que se encontra em paz por não entrar em conflitos necessários, por calar diante de uma ofensa, por permanecer sem reação diante de uma cena de injustiça.
Que possamos, então, buscar a coerência entre o que desejamos para o mundo e as nossas ações. É a busca por essa coerência que vai nos levar para a frente, é o que vai nos ajudar a talhar cada pensamento, cada decisão de postura, cada atitude. Pouco a pouco. Mas sempre.
E que sejamos imbuídos e inspirados pela esperança de Paulo Freire, que nos diz que:
“Pensar que a esperança sozinha transforma o mundo e atuar movido por tal ingenuidade é um modo excelente de tombar na desesperança, no pessimismo, no fatalismo. Mas prescindir da esperança na luta para melhorar o mundo, como se a luta se pudesse reduzir a atos calculados apenas, a pura cientificidade, é frívola ilusão. Prescindir da esperança que se funda também na verdade como na qualidade ética da luta é negar a ela um dos seus suportes fundamentais. O essencial, como digo mais no corpo desta Pedagogia da esperança, é que ela, enquanto necessidade ontológica, precisa de ancorar-se na prática. Enquanto necessidade ontológica, a esperança precisa da prática para tornar-se concretude histórica”.
Luísa Módena Dutra, Kátia Del Giorno e Viviane Ribeiro