Os Fios e seus Nós

Imagine que você tenha uma joia preciosa, seja de ouro ou de latão; uma correntinha de pescoço comprida e delicada que agrega em si muitos significados e valores. Ela tem, principalmente, grande valor sentimental, porque pode ter sido uma lembrança de alguém que ama, um presente sincero ou o símbolo de um momento especial da sua vida.

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Como toda e qualquer corrente delicada e fina de espessura, ela está sujeita a constantes embaraços. Às vezes, mesmo o maior cuidado ao guardá-la ou manuseá-la não evita que isso se repita. E o que você faz a cada vez que isso acontece? Bom, em alguns dias você tem mais paciência e passa ali um tempo interminável encontrando as pontas, entendendo o caminho que aquela corrente fez para se embaraçar tanto, e desatando nó por nó. Em outros dias, a paciência não está lá essas coisas, ou o seu tempo está curto, e você faz algumas tentativas um pouco mais bruscas e, no final, a deixa daquele jeito mesmo para tentar depois, em algum outro momento mais tranquilo.

As variações dessa hipótese podem ser inúmeras. No entanto, em algum momento você pensa em quebrar essa correntinha para que consiga, enfim, desembaraçá-la? Pode ser que até dê vontade, mas você não faz. E por quê? E se transformarmos essa reflexão em uma metáfora para o cuidado com as relações humanas? Algo muda?

Há uma história que narra uma ação de Alexandre Magno, rei da Macedônia, em uma de suas viagens. Durante uma parada na capital da Frígia, ele soube que a carroça do rei daquele lugar estava presa por um nó e que um oráculo prometera todo o império da Ásia para aquele que conseguisse desatá-lo. Não conseguindo desfazer o nó, Alexandre o corta com sua espada, impossibilitando a corda para um novo uso. Esse fato é contado pelo filósofo francês Jean Marie Muller para simbolizar a ação da violência, rápida e brusca, e a sua ineficácia na administração de uma situação conflituosa, seja ela na esfera privada, pública ou social.

Segundo Muller, a paciência – aquela mesma utilizada para desatar um nó – é uma força essencial para a resolução de conflitos. Segundo ele, “a violência é sempre uma impaciência. A violência é precipitação; é um excesso de velocidade da ação. Violenta o tempo necessário ao crescimento e ao amadurecer de qualquer coisa. Não que o tempo aja por si só, mas concede à ação o tempo necessário para tornar-se eficaz. Por isso, a virtude da paciência encontra-se no cerne da exigência da não-violência”.

Os conflitos fazem parte do nosso dia a dia, dos mais simples aos mais complexos, sem que precisemos fazer um juízo de valor. Ou seja, não será a eliminação do conflito que nos trará tranquilidade, mas sim a sua boa administração. Considerando que somos seres relacionais, que nos educamos e encontramos nossa autonomia por meio do autoconhecimento e da construção de nossas relações, vale a pena pensar: qual o cuidado que tomamos com esses fios da nossa vida e seus nós inerentes?

Luísa Modena Dutra

3 respostas para ‘Os Fios e seus Nós

  1. Adorei a metáfora!
    Precisamos mesmo exercitar a paciência; levamos tempo para construir, reconstruir, a questão é o olhar afetuoso, lançado para além dos objetos, para as pessoas. Cuidado para não desfazer, romper bruscamente quando se trata das relações… Paciência para modelar, administrar, aceitar, conviver.

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